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Outro projeto para o centro

24/04/2013 | 2h05

O Estado de S. Paulo

 

A cada governo, um novo projeto para a recuperação do centro da cidade de São Paulo é apresentado. Considerando-se apenas os elaborados nos últimos 15 anos, a área já inspirou desde uma Broadway paulistana até um polo tecnológico, mas o centro nunca deixou de ser uma concentração de prédios degradados por onde circulam uma multidão de trabalhadores durante o dia e grupos de viciados e traficantes à noite. O Projeto Nova Luz, de Gilberto Kassab, nem sequer teve publicado o edital para as obras orçadas em R$ 1,1 bilhão. O Programa Renova Centro, lançado em 2009, que destinava mais de 60 edifícios para moradia popular, também não vingou. Nenhuma das 3 mil unidades previstas foi entregue.

 

Agora, no início do governo de Fernando Haddad, como era de esperar, mais um plano é apresentado, dessa vez com base numa parceria com o governo estadual e a iniciativa privada - o Casa Paulista. É um projeto que foge dos padrões de São Paulo, segundo seus autores - tanto o da urbanização no estilo BNH, que consolida blocos de pobreza, quanto o "medieval", que instalou condomínios cercados por muros. As 20 mil moradias previstas seguem o conceito "misto"- pessoas de faixas de renda diferentes, além dos usos habitacional, comercial e cultural para os imóveis.

O investimento previsto é de R$ 4,6 bilhões e o número de pessoas beneficiadas deverá chegar a 80 mil. A iniciativa privada deve entrar com R$ 2,6 bilhões, o governo estadual com R$ 1,6 bilhão e o municipal com R$ 404 milhões. Ou seja, é um projeto muito mais do Estado que da Prefeitura. A meta é entregar os primeiros prédios em dois anos e o restante em quatro anos. Os imóveis atenderão famílias com renda entre R$ 755,00 e R$ 10.848,00 e as prestações vão variar de R$ 320,00 a R$ 1 mil.

Para o fundador do Instituto Urbem, Philip Yang, que atuou no desenvolvimento do Casa Paulista, o que se pretende é o convívio de pessoas de diferentes níveis de renda em uma área com infraestrutura de transportes e algumas características que remetem a cidades como Nova York, Barcelona e Copenhague, apreciadas por suas calçadas largas, comércio, serviços e prédios com porta diretamente ligada aos passeios públicos. Os prédios ocuparão áreas hoje tomadas por imóveis deteriorados, próximos de estações de metrô, trens e de grandes avenidas.

Reportagem publicada há um mês no Estado mostrou que o centro, desde 2010, chama a atenção do mercado imobiliário em decorrência do esgotamento do estoque de terrenos em áreas nobres. Dez empreendimentos estão em fase de lançamento, construção ou entrega na região e os apelos mais usados para atrair compradores são a farta infraestrutura e a oferta de transporte. Ali, pode-se trabalhar, estudar ou se divertir sem a necessidade de enfrentar o trânsito em grandes deslocamentos, afirmam os corretores.

Nos últimos três anos, foram lançadas 9,7 mil unidades residenciais no perímetro que se pretende revitalizar. A zona norte, que representa uma área dez vezes maior, ganhou 12,7 mil unidades no mesmo período. Este é um sinal de que o setor privado tem feito a sua parte na revitalização do centro, enquanto o poder público esteve sempre longe de cumprir as suas promessas. Os investimentos privados só não foram maiores porque ainda existem ali muitas áreas onde predominam cortiços, viciados e sem-teto.

A demora do poder público para assumir a parte que lhe cabe foi um dos principais motivos da frustração dos planos anteriores de recuperação da região. Urbanistas alertam que, além disso, o governo deve se conscientizar de que, se o conceito "misto" é urbanisticamente ideal, para concretizá-lo é preciso assegurar crédito às famílias de menor renda para que elas sejam de fato beneficiadas. Em situações como essa, com frequência as pessoas de renda mais alta passam a exigir benfeitorias que acarretam despesas que as menos favorecidas não conseguem pagar.

A atenção a esse ponto é essencial para que o projeto não seja desvirtuado.

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