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Critérios para o 5G: roteiro para a escolha

 

Folha de São Paulo

7 de dezembro de 2020

Philip Yang e José Roberto Castilho Piqueira

Há três critérios fundamentais que precisam ser observados na definição do padrão 5G a ser estabelecido no Brasil. A escolha de uma alternativa para as redes digitais de telecomunicações é tarefa complexa e especializada, mas ao final a decisão final deve considerar três linhas de raciocínio acessíveis a qualquer não-especialista interessado no assunto.

A primeira é a mais óbvia e refere-se ao custo. Um país com alto índice de pobreza e de grande extensão territorial como o Brasil deve buscar o sistema que proporcione a cobertura mais ampla possível, a custos compatíveis com nossa realidade. Deve-se perguntar: qual fornecedor permite que os serviços de rede sejam acessáveis ao maior número de pessoas e agentes econômicos?  Escolher uma solução cara, que exclua milhões de usuários, perpetuará os já péssimos índices de produtividade do trabalho e aprofundará nosso atraso social, educacional e competitivo.

Uma segunda linha diz respeito à segurança de dados e privacidade. A proteção de fluxos de informações relativas a indivíduos, corporações e a nações soberanas é algo imperativo para qualquer arquitetura de redes. Deve ser lembrado que tecnologias de rede nunca são 100% seguras e escolhas devem recair sobre aquelas que oferecem maior proteção. Privacidade, segredos industriais e informações de Estado precisam, ao circular, ter sua integridade e segurança garantidas. Imunidade a ataques cibernéticos que ameacem soberania, economia e vidas é requisito primordial para a escolha.

A terceira linha trilha sobre os caminhos da geopolítica e da geoeconomia. Riscos e oportunidades ligadas à opção devem ser objeto de análise cuidadosa. O Brasil oferece um mercado de centenas de milhões de consumidores. Isso é um ativo real que não pode ser concedido ou obstado a este ou aquele fornecedor, sem razões objetivas ou por motivação ideológica.

A competição internacional coloca em lados opostos os Estados Unidos e a China, que lutam por condições de acesso ao nosso mercado e um posicionamento estratégico na cadeia de valor associada à rede 5G. Ao Brasil cabe abrir diálogo altivo com ambos os contendores para obter as contrapartidas relativas aos nossos interesses nas respectivas relações bilaterais.

Se os Estados Unidos querem maior acesso ao nosso mercado de bens tecnológicos, por que não exigir que eliminem as inúmeras barreiras que afetam as nossas exportações? Se a China não quer ser eliminada de uma possível concorrência, por que não buscarmos um acordo que garanta volume de investimentos diretos, transferência de tecnologias e expansão de unidades produtivas no Brasil?

Outra hipótese, menos intervencionista e menos estratégica, mas igualmente garantidora de interesses da população, seria a abertura de concorrência pura e simples, em que os critérios de preço, segurança e qualidade sejam cristalinamente estabelecidos. Uma escolha feita de forma neutra nos assegurará o melhor serviço.

Estamos diante da oportunidade de construir inteligentemente o acesso a uma tecnologia que habilita todas as outras que compõem o universo digital moderno – desde o ensino remoto e a telemedicina para locais distantes, a democratização da produção e distribuição cultural, até o desenvolvimento de aplicações de inteligência artificial, internet das coisas e Big Data. Bem conduzida, a implantação do 5G pode colocar o Brasil em pé de igualdade aos núcleos dinâmicos da economia mundial. Mal conduzida, significa atraso e isolamento imperdoáveis.

As três linhas de conduta apresentadas, seguidas conjuntamente, permitirão a construção de caminhos para o enquadramento mais racional do tema à luz dos interesses de todos os brasileiros. Qualquer decisão tomada, boa ou ruim, terá efeito irreversível sobre as gerações futuras.

 

Philip Yang, Mestre em Administração Pública pela Universidade Harvard, é fundador do URBEM - Instituto de Urbanismo e Estudos para a Metrópole.

 

José Roberto Castilho Piqueira, professor titular do departamento de Engenharia de Telecomunicações e Controle da Escola Politécnica da USP, da qual foi diretor. É diretor de operações da Fundação para o Desenvolvimento Tecnológico da Engenharia (FDTE).

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